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Cansados aos 20: Por que estamos todos exaustos?

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    CTRL POP
  • 18 de set.
  • 4 min de leitura

Por Sophia Garcia


O Brasil ocupa a segunda posição no ranking mundial de casos de síndrome de burnout, atrás apenas do Japão. De acordo com dados da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt), cerca de 30% da população ocupada no país já sofre com a síndrome. Além disso, dados do Google Trends indicam que a busca online por "burnout" aumentou 37% em 2024, e no período entre 2023 e 2024 alcançou os maiores volumes de pesquisa desde 2004, quando o levantamento começou a ser feito. 


A síndrome de burnout, que é caracterizada pelo esgotamento físico e mental relacionado ao trabalho, passou a ser reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma doença ocupacional, reforçando sua importância como um problema de saúde pública. Embora a síndrome esteja tradicionalmente ligada ao ambiente de trabalho, uma nova realidade surge: a exaustão crônica atinge cada vez mais cedo a geração Z, aqueles que estão adentrando o mercado de trabalho ou acadêmico, e até mesmo aqueles que não estão inseridos nesse contexto são afetados.


O Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional se manifesta através de uma combinação de sintomas psicológicos e físicos. O estresse e a falta de vontade de sair da cama ou de casa, quando persistentes, podem ser indicativos iniciais. Dentre os principais sinais, destacam-se cansaço excessivo (físico e mental), dificuldades de concentração, sentimentos de incompetência, dor de cabeça frequente e alterações no apetite. A pessoa pode também apresentar alterações repentinas de humor, insônia, isolamento, dores musculares, somados a um sentimento constante de negatividade, fracasso e desesperança.


A pandemia, e seus resquícios, e a glamourização do cotidiano nas redes sociais influenciam e agravam essa sensação de cansaço excessivo, segundo Sarah Mota, pós graduanda em TCC pela PUC do Rio Grande do Sul. Sarah atua como psicóloga clínica e organizacional e acompanhou o impacto das mudanças da pandemia no mercado de trabalho e seus desdobramentos.

Sarah Mota - Psicóloga e Pós-graduanda em TCC pela PUC RS
Sarah Mota - Psicóloga e Pós-graduanda em TCC pela PUC RS

Efeitos da Pandemia de COVID-19


O contexto da pandemia de COVID-19 intensificou o sentimento de instabilidade e a busca por propósito e qualidade de vida no trabalho. “Com a retomada da rotina, a ansiedade se intensificou, a procrastinação aumentou e a exaustão se tornou frequente. A reabertura dos espaços sociais e o retorno ao trabalho presencial trouxeram de volta a pressão por produtividade. O ambiente de trabalho, que antes era uma fonte de lazer e interação social, passou a ser visto como um lugar de estresse." disse a especialista.


“Os principais impactos da pandemia na saúde mental dos jovens adultos foram a falta de controle e a incerteza. Isso gerou um estado de alerta constante, pois as pessoas não sabiam o que ia acontecer. Além disso, houve o isolamento social, que afetou a capacidade de socialização e a rotina, intensificando quadros de ansiedade e depressão”, afirma a especialista. Ela acrescenta que a pandemia trouxe um sentimento de vulnerabilidade, levando as pessoas a questionarem seus trabalhos e estilos de vida. Essa busca por propósito, somada à incerteza sobre o futuro, criou um ambiente de pressão interna que se soma às pressões externas já existentes.


Redes Sociais e Wellness


O uso intenso das redes sociais intensifica o distanciamento com a realidade e acaba criando uma pressão ainda maior para ser considerado bem sucedido jovem. “A gente para de se autoconhecer, muitas vezes fica nesse movimento de entorpecimento digital, de sempre fazer check-in, postar fotos, mostrar o que está fazendo. E vai se entorpecendo, vai se esquecendo de colocar o pé no chão, sentir a grama, cheirar um ar livre, ver o sol, sentir o sol na pele.” 


A pressão por uma "performance ideal", a romantização da rotina corrida nas redes sociais e a sensação de que "todo mundo está vencendo o tempo todo" criam um ciclo de autocobrança que leva os jovens ao esgotamento precoce, à ansiedade e à depressão. A psicóloga explica que essa pressão não se limita ao ambiente profissional: “A pressão por alta performance é uma das principais causas do esgotamento. Essa pressão não se limita apenas ao ambiente profissional, mas também está presente nas redes sociais, onde a vida é romantizada. É como se existisse um ciclo de autocobrança que faz com que os jovens se sintam esgotados, ansiosos e deprimidos", conclui Sarah Mota.


Compilado de conteúdo "Wellness" disponível no TikTok
Compilado de conteúdo "Wellness" disponível no TikTok

Em meio a essa exaustão, surge a crescente popularidade do "wellness". Embora a busca por bem-estar seja positiva, o que antes era um refúgio para aliviar o estresse tornou-se, para a Geração Z, mais uma obrigação a ser cumprida. A hashtag “wellness” atualmente tem mais de 5.6 milhões de vídeos, e segue em constante crescimento com seus vídeos de saúde, alimentação correta, rotinas e horários regrados. Em 2024, o Instituto McKinsey comprovou que o setor movimenta mais de 18 trilhões de dólares - isso reforça a impressão de que o bem-estar se tornou uma tendência que veio para ficar, moldando novos hábitos de vida e de consumo.


As redes sociais, que glamourizam a rotina corrida, também promovem um padrão de autocuidado muitas vezes inatingível. A prática de exercícios, a alimentação saudável e a terapia, que deveriam ser ferramentas de alívio, são transformadas em metas de performance. Esse "self-care performático" cria uma nova camada de pressão, onde a falha em ter uma vida perfeitamente equilibrada e visualmente agradável nas redes sociais agrava o sentimento de inadequação e cansaço.


“O movimento do wellness está crescendo no Brasil: ‘tenho que acordar às 5h, ir à academia, já ter estudado, feito marmita, trabalhado, lido 10 mil páginas de livro, dormido cedo’. Gente, que horas dorme? E aí esquecem de dormir, de comer, de beber água. Quando esgota, é de uma vez, e ninguém sabe de onde veio. Porque está todo mundo fazendo isso, e quem não faz é visto como errado.” disse a especialista.

A exaustão que atinge os jovens de hoje não é um problema de "falta de força de vontade", mas sim o resultado de um ambiente de múltiplas pressões. A busca incessante por um padrão de vida inatingível, somada à “cultura wellness” que se tornou mais uma obrigação, leva ao esgotamento. Nesse cenário, é fundamental a autorreflexão e a permissão para que os sentimentos de cansaço e ansiedade existam.


Como a especialista conclui, "entender que está tudo bem ficar cansado, está tudo bem descansar, está tudo bem sentir ansiedade, nervosismo, cobrança, medo, indecisão. Está tudo bem se vier de uma forma que faça refletir, gerar mudança, gerar questionamento. Mas negar que essa parte ruim existe é fazer com que ela venha com mais força."



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